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A beleza das mudanças que libertam e das conexões que aproximam

Atualizado: 1 de out. de 2019



Mudar dói. Poucas frases curtas assim trazem uma verdade tão profunda.


Talvez o que mais me surpreenda no ser humano seja o seu anseio desesperado pela estabilidade e sua falta de intimidade com as mudanças. Transformações inevitáveis e muitas vezes inadiáveis que a todos afetam, mas que ainda assim são repudiadas como se possível fosse parar o fluxo do tempo.


Por mais que as rejeitemos, algumas mudanças óbvias irão se impor de uma forma ou outra, como o envelhecimento.


Se a idade pesa sobre o físico, mente e coração poderão perpetuar sua própria juventude. Acredito que pensamentos e emoções possam se permitir jovens, sobretudo naquilo que a juventude tem de mais precioso: sua liberdade ao que é novo e diferente.


Envelhecer parece errado – e o mercado de trabalho está aí para comprovar que atravessar a barreira dos quarenta ou cinquenta pode significar o exílio sumário. Completar ciclos de calendário passa a ser um crime passível de “expulsão da tribo”.


Mas não é sobre a inevitável mudança trazida pelo tempo que quero falar agora. Quero mencionar as mudanças desejadas ou inesperadas. Trazer nestas linhas algumas ideias e percepções que há tempos rondam minha cabeça, conflitando com minhas impressões, alterando entendimentos e fortalecendo descobertas.


Como acontece com muitos, minha maior mudança se impôs contra a minha vontade. O destino acabou por me trazer tudo aquilo que evitei a vida toda. Esfregou em minha cara a verdade que minha miopia existencial evitava reconhecer.



Falei sobre mudanças inevitáveis aqui: Vendavais são inevitáveis, saiba controlar as velas



Quem faz trilhas de moto sabe que se fixar o olhar na árvore ao lado da curva a moto será atraída por ela, inevitavelmente. Se você quer percorrer o trajeto certo, foque seu olhar na saída da curva, nunca na árvore. Sempre apliquei este sábio conhecimento nas minhas trilhas e viagens de moto por aí, mas deixei de aplicá-lo na vida. Um dia esse meu olhar focado no que queria evitar me trouxe o choque com a árvore indesejada. Minha face descoberta contra o tronco rígido e áspero da realidade.


Tudo na vida é movimento, a mudança é a regra. Nada é concreto, contínuo e imóvel. O universo se move, vibra, desde os átomos até as galáxias. Por que diante de um universo em continua mudança acreditamos nós na ilusão poderosa da estabilidade?


Ansiamos pela vida estável: casa, família, trabalho, um carro novo, boletos pagos, alguns finais de semana na praia, um restaurante vez ou outra e uma viagem ao exterior por ano. A promessa da vida consumista tão encantadora quanto mentirosa.


É isso que é a vida?


Há algum tempo me dedico a escrever minhas impressões sobre a vida, sobre jornadas profissionais e desenvolvimento pessoal. Uso o LinkedIn para divulgar meus textos e para conhecer os escritos de outras pessoas, aprender com elas, compartilhar visões e alcançar novos pontos de vista e entendimentos sobre nossos dilemas, desafios, verdades e crenças.


Tenho sido agraciado com a descoberta de muitas pessoas especiais por aqui. Algumas amizades surgiram e se fortaleceram no compartilhar de experiências, sucessos, fracassos e dores. Um contato pessoal com um nível de profundidade que poucas vezes obtive no mundo offline, mas que por aqui é possível. Meus textos trazem minhas impressões e descobertas a partir daquilo que sinto ou sofro e essa minha verdade parece se conectar com a verdade de outras pessoas. Laços inesperados então nascem e se fortalecem, tão surpreendentes quanto poderosos.


Pessoas especiais espalhadas pelo mundo, que de outra forma teria sido impossível conhecer. A rede nos uniu e sou grato a esta tecnologia que rompe barreiras geográficas e permite o encontro de espíritos livres.





Recentemente comecei a aceitar convites para encontros offline, cafés e conversas ao vivo. Tive muito receio... sou daqueles que nunca fez networking, que se isola no canto da sala numa festa, que prefere ficar calado a participar de conversas com desconhecidos. A cada convite meus receios voltam e a timidez se impõe, mas algo dentro de mim me leva adiante.

E quantas surpresas acontecem nestes encontros! Como é bom conhecer pessoas ao vivo conectadas previamente por algo mais profundo! Conhecer pessoas desta forma de alguma maneira nos liberta de máscaras sociais, das personagens que às vezes assumimos para causar uma boa impressão. Eu que sempre odiei a vida social hoje sou fã destes encontros e da oportunidade de conhecer pessoas primeiro pelos seus ricos aspectos interiores.


O que mais encontro nessas pessoas é compreensão e acolhimento. Descobri que existem outros como eu e estes ao me reconhecerem como semelhante me acolhem em suas vidas, mesmo que por breves momentos em um café ou nas longas e adoráveis mensagens escritas ou gravadas com a sinceridade viabilizada pela liberdade do espírito.


Sempre me senti vivendo na época errada, no país errado ou até no planeta errado. Por mais que eu tentasse seguir a vida normal que todos seguiam, as minhas inquietações me atormentavam. Aprendi a perceber o sistema, a matrix, mas a permanecer nela conscientemente, buscando pequenos alívios em fugas eventuais.


Aprendi a sobreviver sem enlouquecer (muito), porém errei ao não perceber que a verdadeira loucura era a minha submissão à falsa ideia de estabilidade que a matrix me oferecia em troca da minha alma, que eu alcançaria tal tranquilidade da “vida certa” se fizesse tudo de acordo com as regras.




Hoje vejo o que muitos já perceberam antes de mim. Pessoas que aprenderam a viver mergulhando no sistema de vez em quando em busca dos recursos necessários para uma vida plena em si, independente de imposições sociais e falsas promessas de estabilidade.


É uma vida muito diferente da que tive até há pouco. Eu vivia no sistema com pequenos mergulhos para fora dele, em busca de alívio eventual. Minhas viagens solo de moto pelos Andes eram fugas de alívio.


Percebi pessoas vivendo o contrário: vivem sua vida plena e mergulham na matrix de vez em quando, pelo tempo suficiente para cumprir um determinado objetivo, permanecendo assim um tanto ilesos às suas influências e promessas vãs.


Aos poucos me liberto das algemas que me foram apresentadas suavemente ao longo da vida. Algemas que vão sendo colocadas aos poucos, pela família, pela escola, pela universidade, pela mídia, pela cultura, pela profissão, pela necessidade de dinheiro.


Algumas vezes eu as percebia, mas eram algemas aveludadas, algumas de ouro, quase confortáveis, que me davam em troca algumas coisas que eu equivocadamente achava fundamentais para a minha vida. O consumismo, a posse, a necessidade de bens, a vontade por coisas que me trariam prazer mas que na verdade apenas aumentavam as minhas obrigações e compromissos.


Mas então minha maior mudança se impôs. E finalmente compreendi as armadilhas: troquei a busca da felicidade por si pela busca da felicidade por ser.


Como dizia Raul, “perdi o meu medo da chuva. E aprendi o segredo da vida vendo as pedras que choram sozinhas no mesmo lugar”. Antes eu pensava que estas pedras choravam pela solidão, mas agora entendo que choravam mais por permanecerem presas a um mesmo lugar.


Vida que é vida não aprisiona. Se a nossa trajetória se resume a trabalho-casa-shopping-diversão eventual-trabalho-casa... estamos algemados, presos, escravizados pelos boletos, faturas, compromissos e impostos. Somos meras abelhas e o mel que produzimos apenas sustenta a matrix. Podemos até polinizar flores, isso é legal e nobre e até melhora o mundo mas é apenas um efeito colateral enganador da nossa escravidão maior.


Prefiro polinizar mentes quando quiser. Prefiro produzir mel e dá-lo de graça a quem possa apreciar. E isso é muito mais do que pagar contas.


É fácil viver assim? Não. De certa forma, estou sendo obrigado a esse caminho mas nem por isso ele é falso ou indesejável. Se a matrix me expulsa por minha rebeldia ou se minha idade é justificativa para meu exílio permaneço grato ao acolhimento do universo real, para além das grades, habitado por pessoas plenas e acolhedoras, que tanto tem me ensinado sobre novas possibilidades e sobre a vida.




Estou aprendendo a ser aquilo que em essência sempre fui e se o preço é perder as coisas que tive, que seja. Mesmo que eu perca tudo e ainda mais um tanto, o preço será pequeno para que eu seja realmente aquilo que sou.


Como fazer então?


Voltando ao mestre Raul, acredito mesmo que "basta ser sincero e desejar profundo, você será capaz de sacudir o mundo”.


A matrix é a razão, o sistema é a racionalidade material e concreta e sua hipocrisia se reveste de realidade por estas suas concretude e materialidade. Só a sensibilidade pode ultrapassar as grades, só a arte pode despertar a consciência. E só a dimensão espiritual desenvolvida e aceita pode permitir a compreensão de que apenas o amor traz sentido para a existência.


Um amor que é a nossa essência, a semente e a permanência de Deus em cada um de nós.


Precisamos pagar contas sim. Cada um de nós precisa descobrir quais as contas certas a assumir e quais delas são desnecessárias e fúteis. Existem caminhos possíveis e é preciso encontrá-los, o que não é nada fácil. Mas a vida é muito mais que isso.


Fico por aqui, propondo a leitura de um artigo fantástico da minha amiga Handra Amorim, “Pra que tanto dinheiro se o pôr do sol é gratuito”, um belo e verdadeiro relato de uma destas pessoas cuja verdade ressoa e apaixona. A conversa recente que tivemos e seu belo texto trouxeram muito sentido às minhas reflexões. O enorme sucesso do artigo mostra que muitos ansiamos por mais, merecemos mais e podemos mais.


Somos muitos espíritos livres pelo mundo e nossas afinidades acabarão por nos unir.


É por aí.



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