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Adversidades inevitáveis: coisas ruins acontecem a pessoas boas o tempo todo


Nenhum de nós estará livre de atribulações ao longo da vida. Uma frase óbvia e verdadeira, mas que eu nunca imaginei que seria realmente aplicada a mim.


Tive uma vida com sucessos em sequência e pequenos fracassos ocasionais facilmente superados, o que me levou a pensar que bastaria seguir fazendo as coisas certas que tudo permaneceria dando certo. Não que eu me julgasse perfeito, mas eu acertava mais do que errava, reconhecia os erros quando ocorriam, os resolvia e procurava aprender com eles. Agia com honestidade, tratava as pessoas com respeito, buscava a maior qualidade no trabalho e me dedicava a uma vida familiar que considerava adequada. Enfim, eu tentava seguir a “cartilha de como ser uma boa pessoa” e acreditava que isso me garantiria uma existência próspera e feliz.


Não vou construir suspense nesse texto e o leitor já percebe onde quero chegar: quebrei a cara, é claro.


Minha vida certinha sofreu um baque. Tudo aquilo em que eu me apoiava ruiu sob meus pés. De um momento para o outro absolutamente tudo o que poderia dar errado deu. A sequência de tombos me levou ao fundo do poço. E depois aos subsolos do fundo do poço.


Dentro de mim a certeza de que “eu não merecia isso, pois fiz tudo certo e sempre fui uma boa pessoa”. Mas parecia que a vida ria de mim e dizia “E daí?”


A vida não é justa. Coisas ruins acontecem a pessoas boas o tempo todo. Fracassos acontecem mesmo quando você faz tudo certo. Coisas dão errado mesmo que você tenha cuidado de todos os aspectos que poderia. Podemos até concordar com estas afirmações, mas muitos pensam que isso só acontece com os outros, nunca com eles. Intimamente pensam que a pessoa que sofre deve ter feito algo errado para receber aquele resultado. E se julgam imunes a estes erros. Eu também me achava um super-herói, sei como é.


Hoje é fácil perceber que cometi erros, mas as decisões que tomei foram as melhores possíveis com base nas informações que tinha. Não é isso que se pede a líderes, executivos e empresários? E não foi isso que havia me garantido o sucesso até então? Eu tinha planos A, B, C..., n. Tinha várias alternativas e muitas salvaguardas e nada funcionou.


Olhar retroativamente e se culpar por suas decisões é injusto com você mesmo, mas é o que acontece. É inevitável passarmos por uma fase de culpa misturada com autocomiseração, revolta e dor.


Encarar a nossa humanidade dói. Pior do que a dor do fracasso em si é a dor que vem da súbita consciência da nossa fragilidade e fraqueza. Perceber que nossa vida não está e nunca esteve sob nosso controle. É nesse momento que a depressão bate à porta e, no meu caso, a porta se abriu e a “distinta” tomou conta da casa.


Este texto não tem o objetivo de afagar a cabeça de ninguém e nem a minha própria. Não acredito em soluções mágicas aplicáveis a todos os que passam por situações difíceis. Mas acredito que compartilhar nossas experiências traz aprendizados e faz parte de nossa humanidade, desde sempre. Todos podemos e devemos aprender uns com os outros e foi isso que nos trouxe até aqui hoje. Se escrevo em meu computador, sentado em uma cadeira confortável cheia de regulagens ergonômicas, ouvindo música e tomando um café é porque outros vieram antes de mim, aprendendo com seus antecessores. Ajudaram a criar este mundo de conforto e utilidades que vivemos, a partir daquilo criado pelos que os antecederam.


Gosto de aprender com biografias. Ver como pessoas capazes de atos heroicos e criações fantásticas tinham seus pontos fracos, fragilidades, manias, comportamentos inadequados. Nem todos somos capazes de atos heroicos ou realizações fantásticas, mas todos sem exceção temos nossos defeitos, erros, pecados.


Uma das coisas que nos faz humanos é a nossa capacidade de amar, mas principalmente os aspectos que nos irmanam são as nossas fraquezas.


Irmanados na fraqueza, mais do que nas forças. Só por isso já deveríamos ser mais humildes, irmãos de verdade, unidos na dor para que ela se cure mutuamente. Como raça humana só chegamos até aqui porque é assim que nossos antepassados viveram, não? Sacrificando-se uns pelos outros, para que a humanidade sobrevivesse. E o que são heróis senão aqueles que se sacrificam pelos outros? E o que são as criações fantásticas, senão aquelas que trazem o bem comum ao maior número de pessoas?


Vivemos tempos egoístas, sabemos disso. Percebemos comportamentos inadequados, levianos e enganadores a todo o momento, na nossa vida e nas redes sociais. Pessoas tentando se dar bem às custas de outros e de seus sofrimentos.


Eu posso errar nas contas, mas me parece que para cada leviano existem uns quatro ou cinco bem-intencionados. Talvez mais, porque as pessoas boas costumam agir com discrição. Pessoas sérias, que entendem os momentos complicados que outras pessoas atravessam, se solidarizam, ajudam, apoiam.


A situação econômica está crítica, o desemprego muito alto, muitas empresas fechando as portas, as condições de trabalho difíceis e muitos passam por enormes dificuldades com suas famílias, suas contas e obrigações. Sei muito bem o que é isso e como esta pressão se abate sobre quem sempre honrou seus compromissos e seu nome limpo.


Muitos olham para estes desempregados ou falidos como se estes estivessem cumprindo um carma ou recebendo uma punição por seus atos. São como os amigos de Jó, aqueles que não acreditam que o mal se abateria sobre uma pessoa sem que ela tivesse alguma responsabilidade ou culpa. De alguma forma ainda tentam apoiar estas pessoas, mas sempre com esta premissa, que quando revelada ofende ao outro. Uma ofensa sentida que aumenta sua opressão e tristeza.


Outros, canalhas, buscam se aproveitar de pessoas sem esperança. Vemos muitos depoimentos sobre isso nas redes sociais e nas conversas com colegas. Pessoas gananciosas tentando ganhar com o desespero alheio, sem o menor pudor, vendendo fórmulas fáceis. Traem a humanidade por seus atos pérfidos, mostrando o quanto estamos distantes daquilo que deveríamos ser.


Também existem pessoas próximas, das quais esperamos algum apoio e compreensão, mas que não correspondem às nossas expectativas. Por algum motivo não nos apoiam, às vezes por não saber como, às vezes por não concordar conosco ou até por nos culpar pela situação que enfrentamos e que as afeta. A decepção inevitável nos surpreende e a dor nestes casos é forte, pois quanto mais próximas estas pessoas maiores serão a decepção e a dor.


Mas existem muitas pessoas que nos ajudam de verdade. Com ações, com palavras, com silêncios cúmplices em momentos de dor intensa. Ao nos irmanarmos como seres humanos pelas nossas fraquezas chegamos mais próximos à perfeição, mais próximos de sermos imagem e semelhança de Deus. Uma oportunidade real de manifestarmos amor sem interesse e solidário, a conhecidos e a desconhecidos.


Na minha história presenciei alguns canalhas e tive algumas fortes decepções com quem não esperava, mas todos estes foram poucos frente à muitas pessoas boas em meu caminho. Alguns verdadeiros anjos, enviados por Deus em momentos críticos para me ajudar a dar mais alguns passos.


As pessoas boas fazem com que eu tenha fé na humanidade, apesar dos maus e da falta de caráter de muitos. Um ato de solidariedade se sobrepõe a mil estelionatos. Um ato de amor se sobrepõe à dor de inúmeros atos de ódio ou de indiferença.


Mesmo com estes anjos eventuais e com apoio de pessoas queridas não é fácil prosseguir, reconheço. Algumas das pessoas com as quais convivo estão em situações muito difíceis. Recebo mensagens de muitos atravessando sérias crises profissionais e pessoais. Tenho muito pouco a oferecer, além de algumas palavras amigáveis e meu compadecimento com suas dores. Sou fraco e frágil também, sei como é. Atravesso meu próprio deserto e sei como é árido. Palavras de apoio me ajudam a dar mais um passo e assim tento fazer com outros.


Todo deserto é uma oportunidade de transformação. Todo final traz a oportunidade do recomeço.



Meu deserto me trouxe a chance de entender a Deus e de conhecê-lo mais intimamente. Desde então, agradeço ao próprio deserto, às perdas, às tempestades de areia, ao calor insuportável e ao frio das noites solitárias. Tive que enfrentar o pior da minha vida para entender o melhor: o amor de Deus e seu cuidado por nós.


Eu precisava reconhecer a dimensão espiritual em minha vida e foi a conversão cristã que me resgatou. Como já disse em outros textos, a descoberta da dimensão da espiritualidade é essencial para a vida e, embora respeite opções diferentes, só posso falar da espiritualidade cristã, por ser a minha, com a licença do leitor e sem o objetivo de evangelizar.


Desde o início desta minha nova jornada recebi o trecho de Mateus 6: 33,34 como uma promessa e um caminho:


“Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas lhes serão acrescentadas. Portanto, não se preocupem com o amanhã, pois o amanhã se preocupará consigo mesmo. Basta a cada dia o seu próprio mal".

Os versículos que os antecedem são poéticos, sobre as aves no céu que não semeiam nem colhem e mesmo assim o Pai celestial as alimenta e sobre os lírios do campo que não trabalham nem tecem, mas se vestem com mais beleza do que Salomão em todo o seu esplendor.


Minha alma ansiosa e inquieta ainda sofre com este aprendizado difícil. Durante toda a vida pensei controlar cada aspecto e cada passo, com minha confiança humana. Uma confiança cega que na verdade era apenas mais uma de minhas falhas. Como assim não se preocupar com o amanhã?


Foi preciso que a minha situação ultrapassasse todas as possibilidades pessoais de superação para que eu começasse a entender. Ainda não compreendo toda a profundidade destas palavras, mas é inegável que as experimento diariamente. Não me faltam as angústias diárias, mas de forma sobrenatural Deus tem cuidado das coisas. Não acontece da forma como eu pensava ou queria, mas de um jeito ou de outro os dias têm se sucedido e Deus tem cuidado de tudo.


Ainda estou longe de sanar meus problemas e sei que devo fazer a minha parte. Mas reconhecer o poder e a influência de Deus sobre a minha vida e minhas necessidades diárias traz consolo e conforto.


Antes a minha fé era impregnada e limitada pela tradição e religiosidade. Uma crença pela crença, por imaginar e aceitar a ideia de um Deus sobrenatural criador de todas as coisas. Hoje a minha fé é por conhecê-lo face a face. Difícil entender? É. Maluquice? Pode ser, afinal Deus fez louca todas as coisas para confundir os sábios.


Estou longe de compreender todos os desígnios de Deus, seus ensinamentos, seu amor por nós. Não pensem que minha conversão solucionou meus problemas, como algumas igrejas que defendem a “teologia da prosperidade” pregam por aí. Nada disso, na verdade meus problemas se acentuaram. Mas a fé me sustenta e me faz levantar a cada dia, disposto a avançar, mesmo que pouco a pouco.


Se antes eu seguia a “cartilha de como ser uma boa pessoa” e achava que era, hoje como cristão me reconheço falho, fraco e pecador. Estou muito distante de ser o que deveria ser e ter esta consciência às vezes pesa nos ombros. Mas eu sei que tenho um longo caminho a percorrer e que Deus estará comigo o tempo todo, durante todo o trajeto.


Se você teve a paciência de ler até aqui, agradeço. Eu escrevo para compartilhar minhas experiências e aquilo que aprendi com meus erros e acertos. Acredito que posso ajudar pessoas desta forma. Eu nunca poderia omitir aquilo que me fez renascer e compreender a vida e minhas adversidades.


Ser cristão me fez um profissional melhor. Não mudou meus princípios, pois sempre me mantive integro e fiel a eles. Mas me fez perceber as pessoas de outra forma e despertou em mim a necessidade de ajudar, mesmo sem saber como muitas vezes. Meus textos são uma iniciativa de tocar mentes e corações e minha nova jornada está sendo construída nessa direção. Não sei exatamente onde irá me levar, mas agora sei que Deus está no controle.


Tendo apoio das pessoas ou não, resolvendo os problemas ou não, o que importa é persistir no caminho que você acredita. Muitos talvez não entendam, alguns talvez não aceitem. Mas é você que precisa saber qual é o seu caminho. Você e Deus. Se você perdeu seu emprego ou fechou a sua empresa, aproveite a chance de recomeçar. Talvez não seja mais da mesma forma, talvez seja a oportunidade de você buscar o que sempre quis fazer. Ouse, arrisque. Afinal, você já perdeu tanta coisa não é? Para atravessar o deserto precisamos de pouca bagagem, mas temos a chance de sairmos renovados ao final.

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